Por Flávia Girardi – De tempos em tempos eu penso no tempo e sobre o tempo. É uma forma de reavaliar. Até porque essa noção temporal vai mudando muito ao longo da vida. Quando eu era criança, lembro quão longa era a espera ao riscar no calendário, os dias do ano, para a chegada das férias. Também achava que aos 22 eu seria bem velha e já teria vários filhos.
Hoje nem dá tempo de riscar os dias, porque quando vi, já passaram e, é claro, acho que alguém de 22 anos é ainda uma criança! E continuará sendo ao longo da vida, “porque o menino é o pai do homem”, como diria Machado de Assis.
Mas acho que é importante parar para pensar no tempo e manter a “prática de pensar a prática” (Paulo Freire). Porque senão, a gente vai indo, indo e o que de fato temos feito?
Algo que nos torna melhor? Algo que faz do mundo um lugar melhor? E nessa reflexão, um monte de verdades se abrem e temos a oportunidade de manter, ou mudar o rumo das coisas.
Pensar no tempo nos faz ver que tudo tem seu tempo, mas isso não nos dá o direito de desperdiçar. Porque o que foi, não volta mais. Mas nos faz ver que a oportunidade é agora. De viver o presente. De fazer o seu melhor no presente. E olhar um pouco mais ao seu redor.
Li outro dia que, nos anos 60, o biólogo e psicólogo suíço Jean Piaget ao compartilhar suas teorias sobre os estágios do desenvolvimento infantil, já sabia diferenciar quem era o público que o ouvia. Quando se tratava de um americano, sempre surgia a mesma pergunta: “como podemos acelerar esses estágios?” A resposta de Piaget era a mesma: “por que você iria querer fazer isso?”
Porque cada etapa, cada reflexão, cada prática é uma oportunidade única.
Quando eu era criança, lembro que era uma alegria andar de carro com minha família. Às vezes, do nada, meus pais nos colocavam no banco de trás e íamos, sem rumo, por estradinhas de terra, só olhando a paisagem. Parando onde dava vontade. Conservei isso comigo e compartilhei com minha filha, Alice. Ela nunca me pediu celular enquanto andamos de carro – nem nas viagens mais longas! Nem nunca viu um desenho. Ela vai olhando o mundo ao redor e descobrindo uma porção de coisas.
Outro dia, ela, que hoje tem 7 anos, me disse que a fachada de uma loja era incrível, porque a luz do sol refletia na cor da parede e parecia que ela brilhava. Eu sempre faço aquele caminho e nunca vi a tal loja.
Por isso é importante a gente olhar. Para fora e para dentro. E sobretudo, se localizar. Para que a gente não seja, como diria mais uma vez Paulo Freire, alguém com uma vida inautêntica, enquanto se sente estrangeiro na sua própria realidade.
Flávia Girardi é jornalista e pedagoga. Também é autora do livro “A formiga que queria voar” da editora Ases da Literatura.
Contato: @flavia.girardi_